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Em um ano extremamente desafiador para a causa socioambiental, diante da pandemia e de tantos ataques enfrentados, foi possível ao menos comemorar um avanço recente para a proteção da Mata Atlântica: a aprovação do Plano de Manejo das Áreas de Proteção Ambiental (APAs) Sistema Cantareira e Represa Bairro da Usina, conforme Decreto nº 65.244, de 14 de outubro de 2020.
O IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas participou do processo de construção deste plano, que teve a primeira etapa iniciada ainda em 2012 e finalizada em 2015, porém não submetida à aprovação do CONSEMA. Após quatro anos de espera, entretanto, o processo foi retomado em 2019 pela Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente, que realizou a atualização de todas as informações, além de promover diversas consultas públicas com ampla participação, da sociedade civil, Conselhos Municipais de Defesa do Meio Ambiente (CONDEMAS), e finalmente aprovado pelo CONSEMA.
Muito se fala sobre Unidades de Conservação e a razão delas existirem. Dentro deste contexto, sempre ganham destaque os grandes parques nacionais e reservas biológicas brasileiros, mas as APAs – Áreas de Proteção Ambiental, muitas vezes ignoradas, merecem atenção similar. Uma APA é uma área natural destinada à proteção e conservação de fauna e flora, dos atributos estéticos ou culturais ali existentes, importantes para a qualidade de vida da população local e para a proteção dos ecossistemas regionais. As APAs existem para conservar processos naturais do desenvolvimento e da adequação das várias atividades humanas às características ambientais daquela região. Ou seja, não exclui o ser humano do processo.
A implementação de uma APA considera as complexas relações políticas, econômicas e sociais de um município ou vários deles e são instrumentos importantes de desenvolvimento regional. Situam-se em áreas importantes para conservação ambiental e muitas vezes para a socioeconomia de uma região ou estado. Só no estado de São Paulo, existem mais de 1,5 milhão de hectares protegidos por APAs.
A APA do Sistema Cantareira se destaca como uma das mais estratégicas do ponto de vista socioeconômico e, com o Plano de Manejo estruturado, terá uma gestão adequada em sintonia com os objetivos socioeconômicos locais. O Sistema Cantareira é um dos mais importantes mananciais do planeta e responsável pelo abastecimento de duas importantes regiões metropolitanas: São Paulo e Campinas totalizando cerca de 9 milhões de pessoas e o sistema abastece aproximadamente 7,6 milhões de habitantes dessa região. Indústrias e empresas de diversos setores, que são chave para a economia do estado, são dependentes dessa água, assim como as produções agrícolas que, além dos recursos hídricos, dependem de um sistema ecológico equilibrado para resultados positivos no campo.
O Plano de Manejo é um documento essencial que protege os recursos hídricos da região, especialmente os reservatórios que compõem o sistema, o Jaguari-Jacareí, Cachoeira, Atibainha e Paiva Castro, bem como os principais rios formadores.
Para além de um documento técnico embasado em critérios científicos, os Planos de Manejo contam com consultas públicas contínuas e consideram em sua tomada de decisão as questões ambientais, socioeconômicas, históricas e culturais e a participação da sociedade e dos diferentes atores envolvidos através de oficinas e audiências públicas.
Considerando o tempo transcorrido para a aprovação do Plano do Manejo e diante dos consequentes benefícios gerados pela proteção desse manancial, como a proteção do solo, cobertura vegetal de Mata Atlântica, regulação do clima, recarga hídrica além da provisão e manutenção dos serviços ecossistêmicos causa espanto possíveis movimentos para a suspensão do Decreto e questionamentos em relação à faixa de preservação de 100 metros no entorno das represas. Outras medidas protetivas, como manutenção de cobertura vegetal em no mínimo 80% da faixa e recomendação de adoção de ações de recuperação e manutenção também estão entre as recomendações para garantir a segurança hídrica por meio da recarga.
Possivelmente, não fossem os interesses em expandir os empreendimentos habitacionais, a população perceberia que é dessa proteção que depende a manutenção de importantes serviços ecossistêmicos como o de regulação, que garante as condições ambientais para a sua própria sobrevivência, como controle climático e qualidade da água entre outros e o serviço de provisão, na produção da água.
É imprescindível o estabelecimento de uma nova visão de desenvolvimento territorial, considerando que os recursos naturais não são um entrave e sim, a garantia de uma nova economia. As soluções baseadas na natureza (SBN) podem integrar esse novo olhar para uma economia realmente sustentável, considerando tecnologias e inovação em todo o território com imenso potencial de ser um polo de economia verde, uma nova matriz econômica que considera que os recursos naturais são finitos, mas podem ser reestabelecidos e trazer toda a região para a nova onda mundial da retomada verde.
É importante ainda enfatizar que são raros e poucos os locais privilegiados como a região do Continuum Cantareira, repleto de belezas naturais, com potencial turístico e atributos especiais como esse remanescente de Mata Atlântica, abundância de água e de biodiversidade.
Por todas essas razões, o decreto deve ser motivo de celebração de toda a população paulista. Nós do IPÊ, que fazemos parte do Conselho da APA Cantareira só temos a comemorar e parabenizar todos os envolvidos nessa conquista. Esse resultado só foi possível graças aos esforços de muita gente comprometida, de critérios técnicos e da visão e integração da sociedade representada neste documento por diversos setores. Reconhecemos o esforço e a importância, além dos benefícios gerados para milhões de pessoas.
Esperamos que prevaleçam sempre o bom senso e a boa ciência para solucionar os desafios socioambientais.
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