Artigo: Ignorar o Pantanal é um erro perigoso
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Por Rafael Morais Chiaravalotti
No Pantanal, praticamente não existem espécies endêmicas. Ou seja, quase todas as espécies de bichos e plantas que existem ali, também podem ser encontradas em algum outro lugar. O Pantanal é um dos biomas mais preservados do Brasil. Menos de 20% da região foi desmatada, e grande parte da pecuária que é feita na região é praticada de forma sustentável. Essas características podem levar a uma percepção de que está tudo muito bem em termos de proteção dessa região, ou ainda criar o pensamento de que, como não existe nada muito especial e nem uma pressão muito grande que pode acabar com o bioma, não há razões para investir esforços nessa região. O resultado disso? O Pantanal nunca é colocado em listas de prioridades para a conservação da natureza, tanto no nosso país como no mundo. E isso traz consequências drásticas. Esse ecossistema é um dos menos pesquisados no Brasil -Amazônia e Mata Atlântica chegam a ter mais de 1000 vezes o número de referências em artigos. Não existe nenhuma lei que rege especificamente o Pantanal (como por exemplo Lei da Mata Atlântica) e nem um fundo para a conservação da região (como o Fundo Amazônia). O Pantanal é um bioma ignorado.
Mesmo sem essa atenção, no entanto, alguns pesquisadores ainda buscam entender e estudar a região, suas interações sociais e ambientais e traçar estratégias, buscando mecanismos de conservação desse bioma. Recentemente, um grupo de 114 cientistas se reuniu e publicou um longo artigo sobre a importância e os desafios para a conservação do Pantanal, chamando a atenção para a ciência praticada no bioma e a necessidade de investimento em pesquisas. Coordenado pelo pesquisador Walfrido Tomas e assinado também por mim, Patricia Medici e Arnaud Desbiez, pesquisadores do IPÊ, o artigo aponta os caminhos para a conservação dessa região, que, na verdade, ainda está sobre risco. Ele pode ser acessado aqui.
O Pantanal não tem muitas espécies endêmicas, de fato. No entanto, a região preserva populações saudáveis de espécies que estão ameaçadas no Brasil. Ali, elas encontram um refúgio para se consumir e reproduzir. Por exemplo, a onça pintada, a anta, o tatu-canastra, o cervo do Pantanal, a ariranha, o tuiuiú, para citar apenas alguns exemplos de animais que vivem nessa paisagem de encher os olhos e o orgulho de qualquer brasileiro. Pelo menos, assim é que deveria ser. A questão principal é que, se o Pantanal for destruído, espécies como essas estarão muito próximas da extinção porque essa região é um dos últimos refúgios para essa fauna que existem no mundo.
Com relação à devastação, é verdade, sim, que apenas uma pequena porcentagem desse bioma foi desmatado. No entanto, outras as ameaças são iminentes e podem afetar a sua conservação. A primeira é a criação de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). A ideia é usar o desnível de altitude nas cabeceiras do Pantanal para gerar energia. Estão previstas atualmente mais de 150 PCHs na região. Porém, o impacto delas pode ser fatal para o bioma, já que o Pantanal existe em razão do pulso de inundação. Todo ano ele enche e esvazia, criando um importante refúgio para biodiversidade. A água é a vida no Pantanal. A presença das PCHs no entorno da região regula esse fluxo de água, afetando diretamente o pulso de inundação. Ou seja, as PCHs podem acabar exatamente com aquilo que faz o Pantanal um bioma vivo e tão diversificado.
Além das PCHs há um plano de tornar o Rio Paraguai, o principal rio da região, mais navegável para o transporte de commodities, como soja ou ferro. Para que isso aconteça é preciso deixar o rio com menos curvas, facilitando o transporte. Assim como as PCHs, a modificação da estrutura do rio afetará o pulso de inundação. Ou seja, um atestado de morte para a região.
O Pantanal também tem sua história, que se não for pesquisada e guardada pode acabar sendo esquecida. Por exemplo, em 1542 foi fundada uma cidade na região chamada Porto dos Reis que, embora tenha chegado a ter quase 3 mil moradores, desapareceu do mapa. Hoje há pessoas que ainda procuram essa cidade perdida. Há também relato das famosas amazonas na região, que segundo os cronistas de 1500, habitavam o norte do Pantanal. Há quem diga que a história das amazonas na região, hoje chamada de Amazônia, se referia a uma tribo de mulheres que moravam no Pantanal.
Ainda há muito que se aprender, descobrir e pesquisar no Pantanal. E apenas assim, por meio de estudos mais profundos, é possível apontar mecanismos que consigam alinhar a conservação dessa região com o desenvolvimento econômico, tão necessário. Mas para isso é fundamental entender que o Pantanal é, sim, um bioma fundamental para os animais e as pessoas que dele dependem e que, por isso, precisa ser protegido. Talvez essa seja a conclusão mais importante do artigo publicado por mais de uma centena de pesquisadores: não ignorem o Pantanal.
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Empreendedor socioambiental no setor de reciclagem, Roger trouxe para o público algumas lições que teve no seu caminho para a construção de uma cooperativa que hoje funciona com 20 catadores de materiais recicláveis que realizam uma Gestão Integrada de Resíduos. Para ele, a liderança para transformação socioambiental só é possível, quando se está aberto à escuta. “Tem uma leitura de contexto trabalhosa e curiosa. Empreender socialmente é diferente de olhar nicho de mercado, para além da oportunidade. É olhar para contexto, relações, empatia. Não existem soluções prontas. Eu passei por isso, perdi anos achando que eu tinha a resposta para o problema, mas eu aprendi que tem que gastar muita sola de sapato, ouvir muito e trabalhar junto. Meu principal aprendizado foi deixar a ideia de soluções prontas para os problemas, para ter soluções criadas em conjunto”, afirma. Carlos Klink, que também já foi secretário do ministério do meio ambiente, concorda, e vai além. Para ele, os profissionais desse setor precisam ter a comunicação como base de seus trabalhos e de sua atuação. “Temos que aprender com as mudanças no mundo, saber estabelecer redes, definir quais são as instituições importantes para manter relacionamento. Os jovens líderes têm que aprender conteúdo, mas têm que saber como vão lidar com esse conteúdo, como vou solucionar problemas e interagir com meus colegas coletivamente. E também saber comunicar pra além do campo meramente técnico, com os públicos diversos. É importante ter a informação, mas saber o que fazer com ela, como engajar e como fazer com que ela tenha sentido. Isso é um aprendizado continuado”, disse.
O Mestrado Profissional da ESCAS tem um histórico ligado fundamentalmente ao IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas. Tendo a Educação como um de seus pilares, o Instituto criou inicialmente o Centro Brasileiro de Biologia da Conservação, para compartilhar o conhecimento desta área com mais profissionais do Brasil e do mundo. O centro de estudos cresceu e, a partir da criação do Mestrado Profissional, passou a se chamar ESCAS, abrigando cursos livres e de pós graduação.
O Instituto começou seu trabalho pela proteção do bioma na região do baixo Rio Negro, no estado do Amazonas, com o desafio de implementar modelos de gestão territorial que contribuíssem para a melhoria da qualidade de vida e conservação da biodiversidade. Ali, promoveu nos primeiros anos parcerias com diversos setores, implementou trabalhos de educação por meio do barco Maíra I, e desenvolveu ações que beneficiaram mais de mil pessoas em 29 comunidades, criando alternativas de renda para famílias da zona rural de Manaus, com foco no desenvolvimento de cadeias produtivas (com agricultura sustentável), do turismo de base comunitária e do artesanato. O IPÊ apoiou a formalização e fortalecimento das organizações locais, com documentação para acesso a políticas públicas voltadas aos agricultores familiares e artesãos, e contribuiu com infraestrutura de negócios, como o restaurante da comunidade Nova Esperança e estrutura de beneficiamento de um grupo de mulheres e uma rede de agricultores. Apoiou também a formação de uma rede de agroecologia no Amazonas, formada por representantes de diversas instituições e grupo de agricultores no estado (Rede Maniva de Agroecologia).
Celio Arago (foto), artesão do baixo Rio Negro foi um desses beneficiados pelos projetos do Instituto. Oficinas, cursos e intercâmbios fizeram com que ele desenvolvesse ainda mais suas habilidades como artesão, ofício que aprendeu com o pai. Da comunidade Nova Esperança, as peças de Celio ganharam o mundo e foram indicadas a prêmios. Após o projeto, Celio hoje ensina a jovens o que aprendeu. “O aprendizado que tive com o IPÊ me abriu muitas portas. Agora eu ensino jovens na minha comunidade para que tenham a mesma chance que eu.”