O Simpósio Internacional de Antas realizado em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, em julho, reuniu 100 especialistas de 15 países. Durante o evento, um novo prêmio em prol das antas foi anunciado
O compartilhamento de dados e de resultados de pesquisas durante o 8º Simpósio Internacional de Antas, em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, de 07 a 12 de julho, possibilitou um momento-chave para pesquisadores, educadores ambientais, veterinários, especialistas em comunicação e profissionais que trabalham com antas sob cuidados humanos que buscam fortalecer estratégias para a conservação dessa espécie que é vital para formação e manutenção da biodiversidade.
As discussões têm o potencial de contribuir com ações para as quatro espécies de anta no mundo: anta centro-americana, anta da montanha e anta asiática, as três listadas como ameaçadas de extinção pela Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza, além da anta brasileira, listada como vulnerável à extinção.
O evento é uma iniciativa do Grupo Especialistas de Antas (TSG – Tapir Specialist Group) da Comissão de Sobrevivência de Espécies (SSC – Species Survival Commission) da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN – International Union for the Conservation of Nature) e do IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas.
Patrícia Medici, coordenadora da INCAB – Iniciativa Nacional para Conservação da Anta Brasileira, projeto do IPÊ, e presidente do TSG desde 2000, destaca o evento como uma oportunidade para a partir das discussões do grupo avançar com novas estratégias para a conservação das antas. “Esse simpósio nos possibilita expor o que cada um está fazendo, nossas ideias e discutir tudo isso. É um momento importante para se pensar sobre as ameaças para as espécies de anta, como o caso dos cachorros para a anta da montanha, e com isso desenvolver intervenções enquanto grupo. O simpósio também levantou a questão das mudanças climáticas nos possibilitando pensar em estratégias para a problemática”, ressalta Patrícia.
As ameaças
Uma das principais referências em estudos sobre mudanças climáticas no Brasil, o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), participou das discussões sobre como antas podem ser impactadas pela crise climática. “As antas possuem um conjunto de condições com as quais elas conseguem sobreviver, mas, com as mudanças climáticas, está ficando mais quente e seco. Essas novas condições que as antas estão experienciando não são as condições favoráveis para sua sobrevivência. À medida que o tempo passa, isso gera um estresse e faz com que os indivíduos fiquem menos saudáveis e essas populações podem acabar se extinguindo. Esse é o primeiro ponto sobre como as mudanças climáticas podem afetar as antas, um impacto a longo prazo. Além disso, as mudanças climáticas geram eventos extremos, temos o fogo no Pantanal, a seca na Amazônia e Cerrado. Esses eventos causam um grande estresse e podem levar à extinção local de antas em um curto prazo”, explica o pesquisador do IPAM, André Andrade.
Dados sobre a contaminação de antas e populações humanas por agroquímicos e metais também foram apresentados. No Brasil, a Iniciativa Nacional para a Conservação da Anta Brasileira (INCAB-IPÊ) realizou uma pesquisa, entre 2015 e 2018, com antas no Cerrado do Mato Grosso do Sul e detectou 13 compostos químicos diferentes, incluindo nove pesticidas e quatro metais. O estudo com antas levou a uma nova amostragem, em 2023, dessa vez com humanos, já que a anta é uma espécie SENTINELA, ou seja, pode ser utilizada para detectar riscos ou perigos a elas mesmas e a outras espécies. A amostragem com humanos detectou cinco agroquímicos, entre eles o Glifosato e Malathion, e dois metais, Cobre e Mercúrio.
As colisões veiculares em rodovias também se destacam entre as ameaças em comum às quatro espécies de antas no mundo, mas os dados do Brasil são alarmantes. Levantamento da INCAB-IPÊ demonstra que, apenas nas rodovias do Mato Grosso do Sul, 100 antas são atropeladas anualmente, o que coloca esta como a principal ameaça à anta brasileira no Cerrado.
Por fim, a quarta ameaça se refere aos ataques de cachorros enfrentados pelas antas da montanha. “Através de registros de armadilhas fotográficas, detectamos dois casos de cães perseguindo e atacando antas da montanha em uma área protegida dos Andes da Colômbia. Isto pode ter consequências negativas sobre as populações de antas da montanha devido à diminuição do desempenho reprodutivo e da eficiência de forrageamento e aumento do potencial para surtos de doenças “, explica Juan Camilo Cepeda-Duque, pesquisador da Fundação WILD Campo Alegre, na Colômbia.
Patrícia Medici Conservation Award
No, último dia do Simpósio , Patrícia Medici, pesquisadora do IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas – recebeu um Life Achievement Award, por seu trabalho de 30 anos na pesquisa e conservação da anta brasileira; um reconhecimento de quatro organizações norte-americanas: Zoológico de Houston (Texas), Zoológico de Columbus (Ohio), Zoológico de Nashville (Tennessee) e Longneck Manor (Texas). Todas as instituições possuem ações sólidas para apoiar a pesquisa e a conservação de espécies ameaçadas em vida livre no mundo.
Além do Life Achievement Award, as mesmas organizações se uniram para criar um prêmio internacional em homenagem à pesquisadora. O “Patricia Medici Conservation Award” será uma premiação anual no valor de 10 mil dólares gerida pela pesquisadora e oferecida para indivíduos que se destaquem na conservação de antas no mundo.
Rick Barongi, reconhecido profissional do mundo da conservação internacional e fundador do Longneck Manor no Texas, Estados Unidos, anunciou o prêmio durante a última palestra do Simpósio Internacional de Antas. “Alguns de seus grandes fãs se reuniram para te dar algo especial que continuará sendo doado. Você fez tanto pelas antas e por este simpósio e nós temos um prêmio para você chamado Patricia Medici Conservation Award. É um prêmio de 10 mil dólares para você e para as antas, mas será mais do que isso. Nós nos comprometemos a oferecer este prêmio anualmente para alguém que você selecione e que nós vamos apoiar”, declarou durante a entrega do cheque símbolo.
“Essa premiação tem um significado imenso para mim como profissional e para o universo da conservação das antas no mundo. O reconhecimento por parte dessas organizações com as quais venho trabalhando há décadas, alguns de nossos grandes parceiros na causa da conservação da anta no Brasil, tem um sabor especial”, afirma Patrícia Medici. “E muito bacana olhar ao redor e sentir o apoio dessa rede que sempre esteve presente em nosso trabalho e sempre estará. Mais importante, é fenomenal pensar que vamos poder transcender esse suporte, anualmente, para outros profissionais dedicando suas vidas à conservação desses animais tão importantes para a manutenção de nossa biodiversidade! Foi um presente muito, muito especial”.
Edições Anteriores
Pela segunda vez, o Simpósio Internacional de Antas foi realizado no Brasil. O simpósio acontece a cada três anos e teve sua primeira edição em San José, Costa Rica, em 2001. As demais edições foram na Cidade do Panamá, Panamá (2004); Buenos Aires, Argentina (2006); Cancun, México (2008); Kuala Lumpur, Malásia (2011); Campo Grande, Brasil (2014) e Houston, Texas, Estados Unidos (2017). Em 2020, o evento seria realizado em Cali, Colômbia, mas devido à pandemia da Covid-19 o encontro foi adiado.
Ao longo de sua história, o Simpósio Internacional de Antas tem se mostrado um momento crítico para a conservação de antas. Em sua oitava edição, o evento reuniu pesquisadores, conservacionistas, educadores ambientais, veterinários, especialistas em comunicação e profissionais que trabalham com antas sob cuidados humanos.
O próximo local a sediar o evento será Cali, Colômbia, em 2027. O anúncio foi feito ao final do Oitavo Simpósio Internacional de Antas.