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Das muitas conquistas nesses nossos 30 anos de história, uma das que mais me orgulho é de ter ajudado a formar nossa equipe. Alguns integrantes que fundaram a organização eram jovens estagiários do projeto de conservação do mico-leão-preto (Leontopithecus chrysopygus), tema de doutorado do Claudio Padua no Parque Estadual do Morro do Diabo (PEMD), extremo oeste do estado de São Paulo, região conhecida como Pontal do Paranapanema. O que os atraía era a chance de ir a campo e colocar em prática o que aprendiam teoricamente em sala de aula. Foi com eles que fundamos o IPÊ em 1992, ano marcante para a conservação da natureza no Brasil e no mundo, especialmente por conte da Rio-92, Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Conservação naquela altura estava em alta! Queríamos salvar o mundo!
O doutorado do Claudio tinha relação com a ecologia do mico-leão-preto e sua plasticidade, ou seja, como esse pequeno primata se comportava e vivia nos diferentes habitats encontrados no PEMD, maior remanescente de mata nativa da espécie. O mico havia sido considerado extinto por mais de 60 anos e estava entre as 10 espécies mais ameaçadas na lista da IUCN na época. O estudo, previsto para durar um ano, acabou levando três e meio, tempo precioso para compreendermos a complexidade da conservação. Descobrimos que o leque de necessidades é bem maior do que o estudo de uma espécie, mesmo sabendo que esse é passo fundamental para proteger qualquer elemento da natureza.
Foi assim que entraram no cenário outros elementos como a educação ambiental para públicos diversos, com propósito de sensibilizar a população local para a importância de se cuidar dos fragmentos de mata e o próprio Parque, tornando o mico em símbolo de orgulho que merecia ser protegido e bem cuidado. Começamos com crianças, mas logo percebemos a importância de envolvermos adultos e tomadores de decisão, pois as urgências eram evidentes, contínuas e crescentes.
Outros campos foram adicionados, como a proteção de habitat aliada à geração de renda, principalmente para os menos favorecidos. Uma vez que a região é a segunda mais pobre do estado de São Paulo, a equipe do IPÊ passou a buscar alternativas sustentáveis de melhoria de vida das famílias locais, aliando renda à conservação ambiental. Começamos, então, a oferecer oficinas sobre como iniciar e manter viveiros de mudas para reflorestamentos, como plantar Sistemas Agroflorestais (SAFs) e produzir artesanatos com foco nas espécies regionais.
Daí partimos para um passo maior, o planejamento da paisagem como um todo, traçando onde são as áreas prioritárias que merecem atenção redobrada em um programa de restauração florestal. Um dos resultados é o que chamamos de Mapa dos Sonhos para o Pontal, composto por imagens que indicam onde precisam ser plantados corredores de matas, pequenos bosques ou faixas de proteção ao redor das florestas nativas remanescentes.
Finalmente, sempre que possível, buscamos influenciar políticas públicas que beneficiam a natureza e as pessoas. Isso tem sido possível por meio dos resultados de nossas pesquisas, que servem de base para tomadas de decisão. Exemplos incluem a criação de uma nova área protegida, a Estação Ecológica Mico-Leão Preto e a inserção de questões ambientais na elaboração de leis socioambientais regionais.
Integradas, essas ações tornaram-se nosso Modelo de Conservação, bastante inspirado em Biologia da Conservação, tema que deu origem a uma das frentes mais relevantes do instituto, a educação conservacionista. A vontade de compartilhar conhecimento nasceu junto com a criação do IPÊ, em Piracicaba (SP). Nossa ideia era ter um braço acadêmico desde o início, mas após algumas tentativas frustrantes, acabamos fundando nossa própria escola em 1996, o Centro Brasileiro de Biologia da Conservação, que evoluiu para a Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade – ESCAS.
Alguns anos depois a ESCAS-IPÊ obteve a aprovação da Capes para oferecer o primeiro Mestrado Profissional na área ambiental do país, em 2008, sendo também a primeira ONG socioambiental a obter esse credenciamento. Preenchíamos todos os requisitos necessários, como número de doutores e publicações. Desenvolvemos, ainda, uma pós-graduação em Negócios Socioambientais e continuamos a oferecer cursos de curta duração em inúmeras temáticas como ESG (Environmental, Social and Governance – em português Meio Ambiente, Social e Governança).
Ao se tornarem mais experientes e prontos a coordenarem seus próprios projetos, alguns dos integrantes cofundadores do IPÊ alçaram voos com novas iniciativas e formando também equipes interdisciplinares, em pesquisas com outras espécies como onças, mico-leão-da-cara-preta (que conduzimos por 15 anos), peixe-boi, e também com a anta-brasileira, o que nos levou a biomas como o Pantanal e o Cerrado. Outro tema que o IPÊ vem trabalhando há décadas é a proteção de nascentes e mananciais que compõem o Sistema Cantareira (SP), do qual milhões de pessoas e inúmeras indústrias dependem. Estudos abrangentes de reflorestamentos adequados e mudanças de práticas agrícolas vêm sendo aplicados com sucesso regional. Na Amazônia, o IPÊ está presente há muitos anos no Baixo Rio Negro e conta com um barco escola que permite navegar por comunidades ribeirinhas e promover iniciativas como turismo de base comunitária e cadeia de produção de bens sustentáveis. Em outras regiões amazônicas, o IPÊ trabalha com unidades de conservação, órgãos públicos diversos e sociedade civil, promovendo soluções integradas para a conservação.
Em 2003, criamos a Unidade de Negócios Sustentáveis, que busca integração com o setor privado, além de cuidar de produtos comunitários. Nossas parcerias empresariais têm sido fundamentais porque com elas nos fortalecemos como instituição, investindo em gestão e transparência, desde a prestação de contas até a comunicação de nossos projetos, trazendo profissionalismo ao nosso trabalho.
Tudo isso seria impossível sem uma equipe engajada e compartilhando de ideais comuns. Sentimentos estes que multiplicam e acabam indo além do nosso time interno.
Nossos alunos ESCAS-IPÊ vêm também promovendo transformações socioambientais. São sementes de IPÊ espalhadas em vários locais do Brasil e do mundo. Esse é um legado que faz diferença. A educação com propósito nobre de proteger a vida traz ganhos coletivos que se tornam ainda mais fortes quando usamos ciência como ponto de partida para ação. É um grande investimento para um futuro mais promissor. Nossos conselheiros e parceiros também somam forças nas conquistas: 6 milhões de árvores plantadas na Mata Atlântica, mais de 7 mil alunos que passaram pela ESCAS-IPÊ, mais de 200 famílias beneficiadas, 12 mil pessoas impactadas positivamente pelas nossas ações todos os anos.
As causas com as quais o IPÊ trabalha movem as pessoas e as atraem para algum projeto da instituição. Defender a vida, seja de planta, animal ou gente, contribui para o equilíbrio dos elementos que garantem a dinâmica natural de tudo o que existe na Terra. Esse princípio acaba dando oportunidades a pessoas que muitas vezes não as têm, para que suas vidas sejam mais dignas, e ao mesmo tempo possam contribuir com algum aspecto da conservação da natureza local.
Conservação da biodiversidade com sustentabilidade e melhorias sociais tem sido um caminho árduo, que precisa de continuidade e persistência. As demandas só aumentam com o decorrer do tempo, uma vez que as pressões são intensas e crescentes. Mas a força parece vir de dentro de cada um que se envolve e sente o pulsar do encanto de proteger as riquezas socioambientais que herdamos nesse planeta. Talvez esse seja o segredo da história do IPÊ: trabalhar por uma causa que é maior do que nós como indivíduos. É um clamor pela inteireza da vida em sua mais plena manifestação. A força que nos impulsiona é querer ser cada vez melhor para contribuirmos para aquilo que acreditamos ser valioso.
Suzana Padua
Presidente do IPÊ
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