Vivenciar princípios e práticas da biologia da conservação na Mata Atlântica alinhadas às questões socioeconômicas e conhecer exemplos de liderança e de desenvolvimento socioambiental atraíram estudantes da graduação e da pós-graduação da Universidade do Colorado/Boulder para dois cursos desenvolvidos pela ESCAS/IPÊ – Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade em parceria com universidade norte-americana.
Em cerca de três semanas no Brasil, os alunos visitaram cerca de 10 projetos realizados pelo IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas na Mata Atlântica e na Amazônia, além de quatro Unidades de Conservação, dois quilombos, três assentamentos rurais e quatro organizações não-governamentais.
Essa foi a primeira vez que a ESCAS/IPÊ recebeu de maneira simultânea alunos da Universidade do Colorado/Boulder para dois cursos presenciais no Brasil. “Um diferencial comum às duas iniciativas é o intercâmbio entre 12 estudantes da universidade norte-americana com 12 alunos brasileiros de universidades que são referência nas regiões visitadas, o que possibilitou a troca de experiências entre eles, incluindo as perspectivas em relação aos desafios e às potenciais soluções identificadas para superá-los. Contamos com a participação de alunos da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Bahia, e da Universidade do Estado do Amazonas”, destaca Eduardo Badialli, coordenador da ESCAS à frente das parcerias internacionais. A participação dos estudantes brasileiros foi financiada pela Sitawi – via Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID).
Biologia da Conservação na Mata Atlântica
Neste ano, o curso realizado pelo professor Timothy Kittel, da Universidade do Colorado/Boulder, e que tem Gabriela Cabral Rezende, pesquisadora do IPÊ, como professora assistente ESCAS/IPÊ, chegou à 10ª turma. Juntas as duas instituições, Universidade do Colorado/Boulder e ESCAS/IPÊ, planejaram os conteúdos e a coordenaram a iniciativa.
A programação teve início na sede da ESCAS/IPÊ em Nazaré Paulista (SP) e avançou até Piracaia (SP) onde os estudantes tiveram a oportunidade de conferir de perto ações do Projeto Semeando Água realizadas em propriedade rural, como restauração florestal em Áreas de Preservação Permanente, Sistemas Agroflorestais (SAFs), Manejo Ecológico da Pastagem e Silvicultura de Nativas.
“Uma experiência marcante foi quando os estudantes conheceram o manejo dos solos tropicais – que tem sua riqueza por conta da ciclagem de nutrientes promovida pelos microrganismos – e necessita de cobertura de matéria orgânica para sua conservação. Práticas vindas do hemisfério Norte, como arar a terra, por exemplo, são prejudiciais em regiões tropicais e comprometem a estrutura do solo reduzindo a capacidade de suporte (seja de qual produção for). Nos sistemas produtivos, inclusive, buscamos simular uma dinâmica parecida com a das florestas tropicais, como forma manter a produtividade”, destaca Gustavo Brichi, engenheiro florestal do IPÊ.
Na sequência, o grupo visitou o Núcleo Picinguaba do Parque Estadual da Serra do Mar onde pode conhecer diferentes gradientes de altitude da Mata Atlântica. Na prática, com orientação do professor os alunos analisaram as diferentes espécies presentes em cada nível chegando ao mangue no final da aula prática.
A próxima parada foi a região do Pontal do Paranapanema, no extremo oeste paulista, onde o grupo visitou os projetos Corredores de Vida, Viveiros Comunitários, Sistemas Agroflorestais, além do Programa de Conservação do Mico-leão-preto e do Parque Estadual Morro do Diabo. A programação também incluiu visita a dois assentamentos rurais e ao Quilombo de Camburi, em Ubatuba (SP).
Trevor Randall, universitário do curso Evolução da Ecologia/Colorado, destaca a escala da transformação da paisagem na região, incluindo o plantio do maior corredor restaurado na Mata Atlântica com 2,4 milhões de mudas de árvores nativas da Mata Atlântica, formando um corredor de 12 quilômetros. “O ponto alto foi presenciar a garra das pessoas – técnicos do IPÊ, viveiristas, colaboradores das empresas de plantio e manutenção – que trabalham duro para dar uma nova paisagem para a região do Pontal”, frisou.
Liderança e Desenvolvimento Socioambiental
Com início na região do Baixo Rio Negro, na Amazônia, o curso Liderança e Desenvolvimento Socioambiental na Amazônia e Mata Atlântica voltado para alunos do Mestrado da Universidade do Colorado/Boulder e da pós-graduação da Universidade Estadual do Amazonas (UEA) e da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), no sul da Bahia, se posiciona como uma ferramenta capaz de trazer contribuições práticas para fortalecer projetos socioambientais em comunidades tradicionais, nos dois biomas. O curso teve sua estreia na programação da ESCAS/IPÊ em 2022, no início da retomada pós-pandemia, e segue como uma iniciativa coordenada pela ESCAS e pelos professores Colleen Lyons e Peter Newton, da Universidade do Colorado/Boulder.
Os estudantes percorreram o Rio Negro com o barco Maíra, do IPÊ e chegaram à Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Puranga Conquista, em Manaus/AM, onde o IPÊ atua por meio do projeto Navegando Educação Empreendedora. “Chamou muito a atenção dos estudantes tanto da universidade norte-americana quanto das brasileiras como o turismo realizado na região trabalha uma verdadeira rede de empreendedores que contribuem com a conservação e a valorização da floresta”. O grupo também visitou iniciativas, como a Fundação Almerinda Malaquias e a Fundação Vitória Amazônica, entre outras.
O curso teve sequência com a ida dos estudantes norte-americanos e brasileiros para o sul da Bahia, onde visitaram uma série de iniciativas que reforçam a importância da conservação da biodiversidade e do desenvolvimento sustentável, como caminho para conciliar questões sociais, ambientais e econômicas. Os estudantes estiveram também no assentamento rural Frei Vantuy, e nas organizações não-governamentais Floresta Viva e Centro Cultural Porta de Trás.
“O grupo conheceu Unidades de Conservação, como o Parque Nacional da Serra do Conduru, teve a possibilidade de conferir de pertos exemplos de produtores rurais que beneficiam a produção como forma de agregar valor, como é o caso da fazenda que colhe cacau e comercializa chocolate artesanal e de um grupo de mulheres que, por meio de uma agroindústria recém-inaugurado, beneficiará as frutas produzidas em assentamento rural, como açaí, cajá, manga, cupuaçu, cacau, graviola e maracujá, além do quilombo Santo Amaro”, pontua Érica Munaro, pesquisadora local no IPÊ. Apesar da programação ser intensa, os estudantes ao final de cada visita participaram de um processo de reflexão sobre o que eles viram com a finalidade de contribuir com os empreendimentos. “Como produto final, o grupo formado por estudantes brasileiros e norte-americanos apresentou uma proposta de intervenção local como forma de fortalecer empreendimentos locais que também favorecem a conservação da biodiversidade”, destaca Eduardo Badialli.