Por ÓSociobio
Crédito da foto: Bruna Brandão/Min. do Turismo
Enquanto o imposto previsto de produtos da sociobiodiversidade pode aumentar pelo menos três vezes com a nova regulamentação, os agrotóxicos terão isenção de 60%, mantendo os chamados incentivos perversos indica nota técnica do ÓSocioBio. Incentivo fiscal para o setor da sociobioeconomia teria impacto de apenas 0,046% na arrecadação e traria vantagens que vão desde a segurança alimentar até o combate à mudança climática
A Reforma Tributária em tramitação no Senado Federal, o PLP 68/2024, poderá sobretaxar produtos da sociobiodiversidade e agravar questões ambientais no Brasil, aponta nota técnica elaborada pelo Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio), Instituto Socioambiental (ISA) e Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN). O IPÊ está entre as mais de 50 organizações apoiadoras dessa proposta – via Nota técnica – que busca garantir equilíbrio tributário e fomento aos produtos da sociobioeconomia.
O estudo revela que, caso aprovada como está, a reforma trará retrocessos significativos, indo na contramão das políticas públicas nacionais e dos compromissos internacionais de combate às mudanças climáticas assumidos pelo país. A Nota Técnica aponta também desigualdade tributária, apresentando informações de subsídios a setores poluentes, como a produção de agrotóxicos.
Entre os principais problemas levantados está a possibilidade de produtos da sociobiodiversidade, como açaí, castanha-do-Brasil, pequi e macaúba, produzidos por povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, serem taxados com a alíquota cheia de 27,97%.
Hoje, por exemplo, os principais estados produtores de açaí têm alíquotas que variam de 3,65% a 9,25%. Com a nova regra da Reforma Tributária, as alíquotas podem passar para até 27,97%, ou seja, pelo menos o triplo e podendo chegar a até sete vezes. Essa mudança ameaça diretamente as economias sustentáveis que protegem florestas e promovem a biodiversidade.
“Estamos diante de uma oportunidade de repensar a tributação, mas a de Reforma Tributária desconsidera o papel estratégico da sociobioeconomia. Produtos da sociobiodiversidade são fontes de renda para comunidades e representam proteção dos nossos biomas, promovendo a biodiversidade e oferecendo serviços ambientais essenciais, como a regulação climática e a formação de solos férteis”, destaca Laura Souza, secretária executiva do ÓSocioBio.
“A inclusão de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais na Reforma Tributária é uma forma de reconhecer sua contribuição única para a preservação ambiental e a diversidade alimentar do Brasil”, afirma João Luís Abreu, economista do ISA, um dos autores da Nota.
Desigualdade tributária
A reforma tributária em tramitação expõe uma profunda desigualdade no tratamento fiscal entre cadeias produtivas sustentáveis e setores poluentes. Caso os produtos da sociobiodiversidade recebam isenção fiscal, a estimativa é de impacto mínimo na arrecadação nacional: apenas 0,046% ou R$ 622 milhões, segundo dados de 2023.
Esse valor quase simbólico contrasta fortemente com os R$ 7,6 bilhões de perdas fiscais previstas pela inclusão da carne na cesta básica, um setor responsável por 57% das emissões de gases de efeito estufa no Brasil. Enquanto cadeias sustentáveis enfrentam o risco de tributação severa, setores altamente poluentes são amplamente favorecidos.
O agronegócio, por exemplo, terá 60% de isenção para o uso de agrotóxicos, e a carne receberá 100% de isenção fiscal.
Propostas de adequação à reforma
A Nota Técnica sugere, entre outras medidas, as seguintes adequações no PLP 68/2024:
1 – Garantir que povos indígenas, povos e comunidades tradicionais e agricultores familiares (PIPCTAF) tenham o mesmo tratamento tributário dos demais produtores rurais beneficiados.
2 – Garantir que produtos e serviços com origem nos territórios de extrativistas, de pescadores artesanais, de povos indígenas, de quilombolas e de comunidades tradicionais tenham o mesmo benefício dos demais produtores rurais beneficiados.
3 – Incluir produtos já utilizados como base da alimentação cotidiana em diferentes regiões do país e que compõem cadeias de valor da sociobioeconomia na cesta básica nacional ou na lista de alimentos que têm 100% de isenção, permitindo alíquota zero sobre sua comercialização e consumo.
4 – Simplificar o processo de adesão a isenções e benefícios fiscais para pequenos produtores e cooperativas e associações de sementes nativas, da agricultura familiar e produtos da sociobiodiversidade.
Mobilização
O ÓSocioBio e as organizações parceiras estão com a campanha Sociobioeconomia na Reforma Tributária, nas redes sociais. A iniciativa busca mobilizar a sociedade para apoiar um imposto justo, que valorize a biodiversidade e promova justiça tributária.