A principal promessa da COP16 da Biodiversidade, em Cali, Colômbia, seria a de estabelecer os meios para a implementação das metas globais, acordadas ainda em 2022, na COP15 em Montreal. Houve avanços em alguns deles, entretanto, os 196 países signatários da CDB – Convenção da Diversidade Biológica (CDB) não entraram em acordo no principal, relacionado ao fundo global para a biodiversidade, um mecanismo financeiro para apoiar a implementação das metas estabelecidas. Ao apagar das luzes, e depois de muitas horas de negociação, as delegações começaram a deixar a plenária e a falta de quórum fez com que a COP16 fosse suspensa. A decisão se dará em encontros futuros, ainda sem definição.
Assim como comentamos antes mesmo da COP16 ser iniciada, o fundo global que existe hoje para financiamento da recuperação da biodiversidade e desaceleração da perda de diversidade biológica no mundo, é irrisório frente aos desafios que temos. A cada dia, perdemos mais espécies, por meio da destruição de florestas e habitats, enquanto avançamos com a intensificação de eventos climáticos. O Fundo Global de Biodiversidade (GBFF), é operado apenas pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF) e os países em desenvolvimento, entre eles o Brasil, defendem que esse fundo deveria ser provisório, portanto essa questão precisa ser revista, criando-se um novo fundo sob o guarda-chuva da COP da Biodiversidade e que possa ser acessado de maneiras diversas, garantindo, assim, uma maior equidade no alcance desses financiamentos, porém alguns países desenvolvidos sugeriram que a questão da equidade deveria ser deixada de fora do acordo. Além disso, as negociações não conseguiram avançar nos valores que devem ser investidos pelos países desenvolvidos em países em desenvolvimento, detentores de maior parte da diversidade biológica no mundo.
O acordo de Kunming-Montreal prevê mobilizar “pelo menos US$ 200 bilhões por ano” para a conservação da biodiversidade até 2030 de fontes diversas sejam nacionais, internacionais, públicas e/ou privadas. Espera-se que os países desenvolvidos aumentem “substancial e progressivamente” seus fluxos financeiros internacionais para a biodiversidade em 20 bilhões de dólares por ano até 2025, e para pelo menos US$ 30 bilhões por ano até 2030. O fundo atualmente chega a cerca de 407 milhões de dólares, contando com as promessas de apoio de alguns países como Nova Zelândia, França e Áustria, além de Quebec, que adicionaram 163 milhões de dólares para o GBFF durante a COP16.
Outro ponto sensível das negociações foi a não entrega das Estratégias e Planos de Ação Nacionais (EPANB) pela maioria dos países. O Brasil já revisou a sua EPANB, com a participação de vários setores: governo, academia, organizações da sociedade civil, empresas e comunidades indígenas e tradicionais. Até o final do ano o documento passa pela avaliação do CONABIO e dos ministérios para assinatura do decreto presidencial e só depois será entregue à CDB para validação das propostas do país às metas de biodiversidade.
Avanços
A COP16, entretanto, passou a ser celebrada como a COP da Biodiversidade das pessoas. Isso porque alguns avanços relacionados à participação social foram conquistados. O primeiro deles, com papel decisivo do Brasil, em parceria com a Colômbia, foi o reconhecimento oficial dos povos afrodescendentes como parte das populações que conservam e usam a biodiversidade de maneira sustentável. Em nota, a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) e o Processo de Comunidades Negras (PCN) comemoraram a aprovação do reconhecimento dos afrodescendentes no texto da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), “especificamente no artigo 8(j), que abrange os conhecimentos, inovações e práticas das comunidades locais e indígenas. Este avanço representa um marco histórico para a justiça e equidade no reconhecimento das contribuições das comunidades afrodescendentes para a biodiversidade e sustentabilidade global”.
Outro avanço considerado histórico foi a criação de um órgão permanente para representar os interesses das comunidades indígenas e locais. Essa entidade irá representar “assuntos de relevância para os povos indígenas e comunidades locais”, buscando garantir a sua participação nas decisões sobre biodiversidade. Essa é uma luta de anos das populações indígenas, que finalmente foi ouvida.
Na COP16, os países também chegaram a um acordo sobre o Fundo Cali, um Mecanismo de DSI (sigla em inglês para Sequenciamento Genético Digital) voluntário para a repartição de benefícios gerados pelo uso de recursos genéticos e da correspondente informação de sequência digital. O fundo vai compartilhar os benefícios de um determinado conhecimento com quem o originou. De acordo com as regras, indústrias farmacêuticas, de cosméticos e de suplementos alimentares, entre outras que se beneficiam comercialmente do uso desses materiais, devem contribuir com 1% do lucro ou 0,1% da receita. O mecanismo não inclui pesquisas acadêmicas, de instituições públicas e organizações que usam as informações de sequência digital, mas não se beneficiam financeiramente delas. Espera-se que ao menos metade dos recursos do fundo apoie povos indígenas e comunidades locais.
Anúncio para o Brasil
Durante a COP16 o Brasil também anunciou a revisão do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), que cria estratégias, instrumentos e arranjos para cumprir da meta de recuperar 12 milhões de hectares de vegetação nativa no país até 2030. O Planaveg apoiará o país na implementação do Marco Global de Kunming-Montreal para a Biodiversidade (KMGBF), conjunto de metas acordadas pela CDB em 2022 para reverter a perda de biodiversidade e promover o seu uso sustentável e a restauração ecológica.
Com informações do MMA e CDB.